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Construção do Conhecimento e Teorias da Aprendizagem (página 3)

2 REFERENCIAL TEÓRICO

     Procura-se tecer breves considerações teóricas a respeito da contribuição piagetiana para a formação do construtivismo e que consequentemente implicam na formação do professor.

   Primeiramente, o sujeito que aprende põe-se  frente  ao  objeto  de sua aprendizagem, transferindo essa experiência para a ação. No conceito de Piaget, o sujeito vai ajustando o objeto aos seus esquemas de compreensão.

    Tais concepções que as ciências foram construindo ao longo da historia, refletem-se na Filosofia e na Sociologia. Hegel e Marx expressam este movimento pela dialética, ou seja, dialética no pensamento e dialética na realidade objetiva. O  princípio da transformação está na essência do próprio ser.

    Contudo, Piaget (1975) faz refletir estas ideias na Psicologia, na Filosofia e, mais especificamente, na Epistemologia, construindo uma nova ciência a que chamou de Epistemologia Genética. Sendo assim, Piaget (1975)  mostra como o homem, logo que nasce, apesar de trazer uma fascinante bagagem hereditária que remonta a milhões de anos de evolução, não consegue emitir a mais simples operação de pensamento ou o mais elementar ato simbólico, apontando que o meio social, por mais que sintetize milhares de anos de civilização, não consegue ensinar a esse recém-nascido o mais elementar conhecimento objetivo. Isto é, o sujeito humano é um projeto a ser construído; o objeto é, também, um projeto a ser construído. Sujeito e objeto não têm existência prévia, a priori: eles se constituem mutuamente, na interação, constroem-se.

   O sujeito age sobre o objeto, assimilando-o: essa ação assimiladora transforma o objeto, na qual o objeto ao ser assimilado resiste aos instrumentos de assimilação de que o sujeito dispõe no momento. Por isso, o sujeito reage refazendo esses instrumentos ou construindo novos instrumentos, mais poderosos, com os quais se torna capaz de assimilar, isto é, de transformar objetos cada vez mais complexos.

  Essas transformações dos instrumentos de assimilação constituem uma ação acomodada. Conhecer é transformar o objeto ou transformar a si mesmo. Assim, o processo educacional que nada transforma está negando a si mesmo.

    Por sua vez, o conhecimento não nasce com o indivíduo, nem é dado pelo meio social. O sujeito constrói seu conhecimento na interação com o meio tanto físico como social.  Essa construção depende, portanto, das condições do sujeito, indivíduo sadio, bem-alimentado, sem deficiências neurológicas etc.

    Além disso, Piaget (1975) derruba a tese de um universo de conhecimento dado, seja na bagagem hereditária (apriorismo), seja no meio (empirismo) físico ou social, criando a ideia de conhecimento-construção, expressando, nessa área específica, o movimento do pensamento humano em cada indivíduo particular, apontando como isto se daria na Humanidade como um todo.

     No entanto, assim como o marxismo atual exerce uma crítica sobre sua conceituação de "classe social", na medida em que "estudos concretos desvendaram formas originais de práticas coletivas?, e na medida em que se toma consciência de que a classe social é alterada pelo modo mesmo como é vivida, a Epistemologia Genética exerce sua autocrítica no sentido de ampliar a compreensão do que significa o "objeto" entendido como  mundo das relações sociais, no sentido do conflito sociocognitivo ou das representações sociais da inteligência, pois a vida social não pode continuar a ser entendida simplesmente como coordenação de operações individuais.

   Na verdade, Construtivismo significa a ideia de que nada, a rigor, está pronto, acabado, e de que, especificamente, o conhecimento não é dado, em nenhuma instância, como algo terminado. Ele se constitui pela interação do Indivíduo com o meio físico e social, com o simbolismo humano, com o mundo das relações sociais; e se constitui por força de sua ação e não por qualquer dotação prévia, na bagagem hereditária ou no meio, de tal modo que podemos afirmar que antes da ação não há psiquismo nem consciência e, muito menos, pensamento. (BECKER, 1984, pp. 7-15)

     Na prática, Construtivismo é, portanto, uma ideia; ou  melhor, uma teoria, um modo de ser do conhecimento ou um movimento do pensamento que emerge do avanço das ciências e da Filosofia dos últimos séculos. Uma teoria que nos permite interpretar o mundo em que vivemos.

    Já, para Piaget (1975), o mundo do conhecimento: sua gênese e seu desenvolvimento. Construtivismo não é uma prática ou um método; não é uma técnica de ensino nem uma forma de aprendizagem; não é um projeto escolar; é, sim, uma teoria que permite (re)interpretar todas essas coisas, jogando-nos para dentro do movimento da História da Humanidade e do Universo. Não se pode esquecer que, em Piaget (1975) aprendizagem só tem sentido na medida em que coincide com o processo de desenvolvimento do conhecimento, com o movimento das estruturas da consciência.

    Entende-se que construtivismo na Educação, pode ser a forma teórica ampla que reúne várias tendências atuais do pensamento educacional. Tendências que têm em comum a insatisfação com um sistema educacional que teima ideologicamente em continuar essa forma peculiar de transmissão, que é a Escola, consistindo em fazer repetir, recitar, aprender, ensinar o que já está pronto, em vez de fazer agir, operar, criar, construir a partir da realidade vivida por alunos e professores, isto é, pela sociedade.

    A Educação deve ser portanto,  um processo de construção de conhecimento ao qual  em condição de complementaridade, alunos e professores e, por outro lado, os problemas sociais atuais e o conhecimento já construído, passem a ser o "acervo cultural da Humanidade".

    O professor afirma que o conhecimento é algo que entra pelos sentidos, ou seja, algo que vem de fora da pessoa e se instala no indivíduo, independentemente de sua vontade, e é sentido por esse indivíduo como uma "vivência". A pessoa,  de modo geral, o sujeito não tem mérito nisso, é passivo. Esse modo de entender o aparecimento, a gênese do conhecimento em um indivíduo, é chamado de empirismo.

    Pode-se dizer que empiristas são aqueles que pensam que o conhecimento acontece porque nós vemos, ouvimos, tateamos etc., e não porque agimos. O conhecimento será, então, sensível no começo, abstrato depois. Alguns exemplos da concepção empirista, na fala dos professores, ilustra este modo de pensar: "o conhecimento, dá-se sempre via cinco sentidos, de uma ou outra maneira; dá-se à medida que as coisas vão aparecendo e sendo introduzidas por nós nas crianças; dá-se pela reação da pessoa através de alguns estímulos, a partir de situações estimulantes, na medida em que a pessoa é estimulada, perguntada, incitada, questionada, ela é até obrigada a dar uma resposta?.

    A concepção de conhecimento acredita que se conhece porque já traz algo, ou inato ou programado na bagagem hereditária, para amadurecer mais tarde, em etapas previstas, chama-se apriorismo. No entanto, pode-se dizer que aprioristas são todos aqueles que pensam que o conhecimento acontece em cada indivíduo porque ele traz já, em seu sistema nervoso, o programa pronto. O mundo das coisas ou dos objetos tem função apenas subsidiária: abastece, com conteúdo, as formas existentes a priori. Como se vê, o apriorismo opõe-se ao empirismo, porque acaba propondo uma visão passiva de conhecimento, pois, de outra maneira, suas condições prévias já estão todas determinadas, independentemente da atividade do indivíduo.

    Presume-se que raramente o professor consegue romper o vaivém entre empirismo e apriorismo: nota-se que a explicação empirista não convence, lança mão de argumentos apriorísticos, e volta, na primeira oportunidade, ao empirismo, se o mesmo acontecer com a explicação apriorista.

    Ao apropriar-se de sua prática, constrói ou reconstrói as estruturas do seu pensar, ampliando sua capacidade, simultaneamente, em compreensão e em extensão. Essa construção é possível na medida em que ele tem a prática, a ação própria; e, também, na medida em que ele se apropria de teorias suficientemente críticas para dar conta das qualidades e dos limites de sua prática. Essas duas condições são absolutamente indispensáveis para o avanço do conhecimento, para a ruptura com o senso comum na explicação do conhecimento. Deste ponto de vista, o conhecimento não é dado nem nos objetos (empirismo) nem na bagagem hereditária (apriorismo).

    O conhecimento é uma construção, ou seja, o sujeito age, espontaneamente, isto é, independentemente do ensino, mas não independentemente dos estímulos sociais. Em seguida, reconstrói (reflexão) o que já tem, por força dos elementos novos que acaba de abstrair. Trata-se da  síntese dinâmica da ação e da abstração, do fazer e do compreender, da teoria e da prática. É dessas sínteses que emerge o elemento novo, no qual o apriorismo e o empirismo são incapazes de processar porque só valorizam um dos polos da relação.

    Na visão construtivista, sujeito e meio têm toda a importância que se pode imaginar, mas essa importância é radicalmente relativa. A partir disso, pode-se afirmar que uma simples mudança de concepção epistemológica não garante uma mudança de concepção pedagógica ou de prática escolar, mas sem essa mudança de concepção, superando o empirismo e o apriorismo, certamente não haverá mudança profunda na teoria e na prática de sala de aula. Sobretudo, a superação do apriorismo e, do empirismo é condição necessária, embora não suficiente, de avanços apreciáveis e duradouros na prática docente.

    Nas palavras de Piaget (1975, p. 386):

As relações entre o sujeito e o seu meio consistem numa interação radical, de modo tal que a consciência não começa pelo conhecimento dos objetos nem pelo da atividade do sujeito, mas por um estado indiferenciado; e é desse estado que derivam dois movimentos complementares, um de incorporação das coisas ao sujeito, outro de acomodação às próprias coisas.

    E, quanto ao problema da construção do novo, Piaget (1975) diz: "a  organização de que a atividade assimiladora é testemunha é, essencialmente, construção e, assim, é de fato invenção, desde o princípio". (PIAGET, 1975, p. 389)

    Isto é, a novidade emerge da própria natureza do processo de desenvolvimento do conhecimento humano. Para que ela não ocorra deve-se obstruir esse processo, trata-se do papel da ideologia que impregna a consciência do professor, determinando suas ações e prática, e seu modo de pensar. 

    Teoricamente, o Construtivismo concebe o conhecimento através de sua gênese e desenvolvimento, e por consequência, um novo modo de ver o universo, a vida e o mundo das relações sociais.

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Como referenciar: "Construção do Conhecimento e Teorias da Aprendizagem " em Só Pedagogia. Virtuous Tecnologia da Informação, 2008-2024. Consultado em 18/04/2024 às 01:30. Disponível na Internet em http://www.pedagogia.com.br/artigos/construcaoconhecimentoeteorias1/index.php?pagina=2