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Aprendizagem da Língua Escrita na EJA (página 3)

 A interpretação da cultura implica em envolvimento e proximidade com os sujeitos. É preciso fazer parte da sociedade pesquisada para que sejam desvelados seus hábitos e costumes, seus modos de vida e suas próprias interpretações, conforme nos afirma Szymanski, 2002. p. 72. "Ao selecionar a entrevista com seu procedimento de produção de dados, o pesquisador deve estar atento não só à fala de seu entrevistado, mas também ao seu meio. Este inclui os diversos aspectos do ambiente físico e social, e também as interações que o entrevistado estabelece durante a situação da entrevista".

 Nesse aspecto, uma das vantagens consideradas é a possibilidade de fornecer uma visão profunda, concomitante  e integrada de uma realidade social complexa, que é composta de muitas variáveis. Para fazer este tipo de análise, nós, professores e pesquisadores,  precisamos de investimento em tempo, recursos e disponibilidade interna, seja no trabalho de campo, que exige um tempo longo, seja na interpretação, na descrição e na análise de dados. É necessário perspicácia para que o foco não seja desviado para coisas mais inusitadas no contexto, em detrimento das explicações mais profundas a serem investigadas.  

 Podemos considerar, através de tais afirmações, que a leitura favorece a remoção de barreiras sociais de que tanto se fala, concedendo oportunidades mais justas, de educação, principalmente através da promoção do desenvolvimento da linguagem e do exercício intelectual. Além disso, aumenta a possibilidade de normalização  da situação pessoal do indivíduo. Por todas essas razões, a leitura é uma forma exemplar de aprendizagem.

Vivemos num mundo repleto de escrita. Desta maneira, não podemos supor que nossos alunos cheguem à escola sem conhecimento sobre ela, precisamos avaliar o que eles já sabem sobre a escrita e mediarmos a apropriação ou a estruturação da mesma, de forma sistemática.

 A escrita é processada por meio de uma construção mental, onde o educando vai construindo seu conhecimento conforme a mediação do professor, ou conforme sinta necessidade de fazê-lo. Assim "o poder da escrita não reside nela mesma, mas no uso que as sociedades fizeram dela". (idem, p.57)

 Devemos primar em esclarecer aos alunos a função prática da leitura e da escrita, a fim de que eles possam sentir essa falta, essa necessidade de aprender. Mais ainda: oferecer condições para que o educando possa desenvolver seu conhecimento, e não apenas ser um reprodutor de signos, sem significados para o seu aprendizado. Por isso, ao se trabalhar com alfabetização, as primeiras atividades com linguagem devem promover, através da oralidade, o resgate da história e da vivência do aluno. Paralelamente, através de atividades com a escrita e a leitura, o aluno é mergulhado aos poucos, no mundo da escrita.

 Resumindo, o trabalho com linguagem deve desenvolver-se sobre três eixos, em perfeito entrosamento e harmonia: a oralidade, a leitura, e a escrita. Esta divisão tem apenas razões didáticas, pois na prática trata-se de são atividades entrosadas, que acontecem de forma intercalada.

 Diante do exposto, percebe-se que deveria haver mais flexibilidade em relação ao tempo para ser trabalhado com a EJA. Uma criança matriculada no ensino regular, tem pelo menos dois anos para ser alfabetizada, ao passo que com os adultos tem-se o contrário, temos que dar conta de dois anos apenas em um, ou seja, alfabetizar e sistematizar conteúdos, sabendo que esta é uma clientela mais difícil de ser trabalhada.

 Geralmente ao iniciar o ano nos deparamos com um grupo cético e desmotivado, diante do qual necessitamos de tempo para elevar a autoestima  e estabelecer uma relação de confiança, a fim de que se abram para novas aprendizagens. Devemos considerar que esse grupo tem ainda que vencer suas próprias dificuldades financeiras, conjugais, etc. No entanto, temos que trabalhar no mesmo regime criado para a educação regular, que já é deficitária e não consegue corresponder às expectativas, quanto mais para a EJA, repleta de especificidades que precisam ser consideradas. Do contrário, estaremos fadados ao contínuo insucesso que assola a educação brasileira. 

 

Referências Bibliográficas

DEMO, Pedro. Metodologia Científica em Ciências Sociais. 5ª edição. São Paulo. Atlas. 1986

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo dicionário da Língua Portuguesa. 2ª edição. Rio de Janeiro. Nova Fronteira. 1986

FERREIRO, Emília. Reflexões sobre Alfabetização. Tradução: Horácio Gonzáles (et.al). 24ª edição. São Paulo. Cortez. 2001 (coleção Questões da Nossa Época, V.14)

__________________.Alfabetização em Processo. Tradução: Sara Cunha Lima, Mariza do Nascimento Paro. 15ª edição. São Paulo. Cortez. 2004

__________________, TEBEROSKY, Ana. Psicogênese da Língua Escrita. Porto Alegre. Artes Médicas. 1986

LÚRIA, A. R. Linguagem, Desenvolvimento e Aprendizagem. São Paulo. Ícone. 1988


SZYMANSKI, Heloisa (org); ALMEIDA, Laurinda Ramalho de; PRANDINI, Regina Célia Almeida Rego. A Entrevista na Pesquisa em educação: A prática reflexiva. Brasília: Plano editora. 2002

TEBEROSKY, Ana ...[ et.al] (org). Compreensão de leitura: A língua como procedimento. ARTMED. Porto Alegre. 2003

TFOUNI, Leda Verdiane. Letramento e Alfabetização. 6ª edição. São Paulo. Cortez. 2004 (coleção Questões da nossa época. V.47)

VALE, Maria José. Educação de Jovens e Adultos: A construção da leitura e da Escrita. São Paulo.IPF. 1999. (série ? Cadernos de EJA nº 4)


MARCOS AURÉLIO RIBEIRO DANTAS: Licenciado em Ensino Religioso pela  ESER/ RN (Escola Superior de Educação Religiosa), Licenciado em Pedagogia pela UVA ( Universidade Estadual Vale do Acaraú), Especialista em Educação de Jovens e Adultos pela UFRN (Universidade Federal do RN) e professor da disciplina Ensino Religioso da rede pública de NatalRN

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Como referenciar: "Aprendizagem da Língua Escrita na EJA" em Só Pedagogia. Virtuous Tecnologia da Informação, 2008-2024. Consultado em 23/04/2024 às 08:00. Disponível na Internet em http://www.pedagogia.com.br/artigos/eja/index.php?pagina=2