Você está em Artigos

As Dificuldades da Escola Perante a Inclusão Escolar (página 3)

Esta afirmação vem diretamente ao encontro do que a interpretação consentânea e inovadora de nossas leis oferece como fundamento da transformação das escolas comuns e especiais. Temos o dever de oferecer uma escola comum a todos os alunos, pois a escola especial os inferioriza, discrimina, limita, exclui, mas também de garantir-lhes um atendimento educacional especializado paralelo, complementar, de preferência na escola comum, para que não sejam desconsideradas as especificidades de alguns aprendizes, quando apresentam alguma deficiência. A escola comum não pode ser substituída pelo ensino especial na oferta do ensino acadêmico, pois este é complementar à formação do aluno com deficiência e trata primordialmente das limitações que a deficiência lhes acarreta quando estudam em turmas do ensino regular.

Tanto a escola comum como a escola especial têm resistido às mudanças exigidas por uma abertura incondicional às diferenças. Uma das mais sérias e influentes razões para que essa situação se mantenha é a neutralização dos desafios que a inclusão impõe ao ensino comum e que mobilizam o professor a rever e a recriar suas práticas, a entender as novas possibilidades educativas trazidas pela escola para todas. Esses desafios estão sendo constantemente anulados, contemporizados por políticas educacionais, diretrizes, currículos, programas compensatórios (reforço, aceleração entre outros). Falsas saídas têm permitido às escolas comuns e especiais escaparem pela tangente e livrarem-se do enfrentamento necessário com a organização pedagógica. Entretanto, existem professoras dispostas a vencer barreiras como a falta de informação, o preconceito e a falta de formação, pois entendem que o papel do professor também é aprender e produzir seu próprio conhecimento.

O professor precisa se abrir para o novo, pensar, produzir seu saber. A postura que os professores podem assumir frente ao novo, ao aprender, identifica diferentes modos de pensar a profissão, ela pode ser entendida como uma constante aprendizagem, parte de um movimento permanente de busca. Nesse sentido, Freire (1996, p. 64) coloca que "a consciência do mundo e a consciência de si como ser inacabado necessariamente inscrevem o ser consciente de sua inconclusão num permanente movimento de busca".

 Esse movimento pode representar o que Pineau; Marie-Michèle (1983 apud PINEAU, 1988, p. 65) chamam de autoformação, definindo-a como "a apropriação por cada um do seu próprio poder de formação". A autoformação é abordada na perspectiva de favorecer uma autonomização do sujeito. Assim, o professor assume a necessidade de aprender e apropriar-se do processo de formação.

Conforme Josso (1988, p. 50):

O ser em formação só se torna sujeito no momento em que a sua intencionalidade é explicitada no ato de aprender e em que é capaz de intervir no seu processo de aprendizagem e de formação para o favorecer e para o reorientar.

De acordo com Hernandéz (1998), a atitude assumida frente ao novo pode revelar diferentes concepções. O refúgio no impossível indica que o novo se apresenta como importante, mas ao mesmo tempo difícil por demandar muito tempo dos docentes. Já o desconforto em aprender, traduz um bloqueio em relação a aprendizagem imposta pelo novo. A revisão da prática não resolve os problemas, indica que tomar a prática como algo que pode ser dissociado da reflexão remete à compreensão de que refletir representa perda de tempo. Aprender ameaça a identidade, esta atitude denota que o novo ameaça sua experiência adquirida e supõe esforço para conduzir a prática. E a separação entre a fundamentação e a prática representa um distanciamento que o próprio professor cria ao pensar-se enquanto prático, assumindo-se como aquele que "aplica" técnicas e teorias, não se percebendo como um produtor de seu próprio saber.

Rancière (2002) relembra os ensinamentos de Jacotot, quando refere: Há desigualdade nas manifestações da inteligência, segundo a energia mais ou menos grande que a vontade comunica à inteligência para descobrir e combinar relações novas, mas não há hierarquia de capacidade intelectual (p.49). As grandes lições deste mestre são mais um argumento em favor da necessidade de combinar igualdade com as diferenças e de nos distanciarmos dos que se apegam unicamente à cultura da igualdade de oportunidades liberal e do mérito para defender a escola do seu caráter excludente, que bane os que por desigualdades significativas de nascimento ou sociais não conseguem preencher os requisitos de um padrão de aluno previamente estipulado.

A escola insiste em afirmar que os alunos são diferentes quando se matriculam em uma série escolar, mas o objetivo escolar, no final desse período letivo, é que eles se igualem em conhecimentos a um padrão que é estabelecido para aquela série, caso contrário serão excluídos por repetência ou passarão a frequentar os grupos de reforço e de aceleração da aprendizagem e outros programas embrutecedores da inteligência.

 Aprender é sempre um desafio. Os novos conteúdos precisam ter algum sentido para quem irá aprender, pois aprender tem de fazer sentido. Por isso, também é preciso querer aprender.

Anterior   Próxima

Voltar para a primeira página deste artigo

Como referenciar: "As Dificuldades da Escola Perante a Inclusão Escolar" em Só Pedagogia. Virtuous Tecnologia da Informação, 2008-2024. Consultado em 19/04/2024 às 07:49. Disponível na Internet em http://www.pedagogia.com.br/artigos/incluescolar/index.php?pagina=2