Você está em Artigos

A Infância como Categoria Histórico-Social

Autor: Jónata Ferreira de Moura
Data: 01/07/2009

Entre os séculos XV a XVIII a infância, como a concebemos hoje, começou a ganhar importância de singularidade. Neste período evocaram a necessidade de estudar e analisar as crianças pelas suas particularidades e peculiaridades, pois elas eram totalmente diferentes dos adultos, dessa feita, pensavam, sentiam, falavam, realizavam atividades de maneira ímpar. Entretanto há uma dúvida no ar: antes do século XV, como nossas crianças eram vistas? Quais as concepções acerca dos pequenos antes desse período da história da humanidade? Silva (2007, p. 23) nos revela esse cenário mostrando-nos que desde Platão até chegarmos a Rousseau a criança é tida como um ser imperfeito.

Desde o conceito de infância que se imprime na obra de Platão, de uma proposição do ideal de uma Paidéia Justa, na qual a concepção de infância não é a principal preocupação, mas um conceito que se insere na própria ausência de uma marca específica que se mescla entre o estado de inferioridade da criança perante o adulto e cidadão e aquela que acompanha o pensamento educacional na sua necessária afirmação na perspectiva de um futuro melhor e como possibilidade do que poderá ser. Passa pelo Emílio (ROUSSEAU, 1968) no qual vemos inaugurar-se um novo modo de pensar a infância moderna e a sua educação, entendida como uma formação moral e racional voltada a submeter a natureza na qual o homem está imerso desde seu nascimento e próximo dos animais, cultivando-lhes o espírito para que se torne humano.

Sendo totalmente inferior aos adultos, as crianças deveriam ser submetidas aos mandos e desmandos de todo e qualquer ser que já tivesse alcançado o estágio da vida adulta. Não havia cuidados higiênicos necessários aos membros da infância, pois prevalecia à importância à vida adulta (só aos adultos caberiam todos os cuidados necessários). Criança era um ser que nascia e se conseguisse crescer e progredir se tornaria um cidadão. Na Idade Média, seria mais um camponês ou nobre, nesse sentido, ou iria trabalhar para sustentar os dominantes ou seria servido pelos dominados. No início da Idade Moderna as preocupações com as crianças não avançaram substancialmente, pois

[...] pode-se apresentar um argumento contundente para demonstrar que a suposta indiferença com relação à infância nos períodos medieval e moderno resultou em uma postura insensível com relação à criação de filhos. Os bebês abaixo de 2 anos, em particular, sofriam de descaso assustador, com os pais considerando pouco aconselhável investir muito tempo ou esforço em um "pobre animal suspirante", que tinha tantas probabilidades de morrer com pouca idade (HEYWOOD, 2004, p. 87).

Assim, as crianças que conseguiam sobreviver só poderiam chegar ao status de ser humano quando conseguissem realizar tarefas que os adultos realizavam. Para tanto não era preciso uma pessoa preparada para cuidar dos infantes. Qualquer adulto poderia exercer essa função, pois aquela coisinha que nos faziam sorrir era um ser que pleiteava a categoria adulto; não havia apego às crianças, o sentimento não poderia ser igual ao de dois adultos, tampouco forte entre os membros da família e suas crias, pois existia um animalzinho que poderia se transformar em um ser humano igual aos demais.

Contudo, um sentimento superficial da criança - a que chamei de "paparicação" - era reservado à criancinha em seus primeiros anos de vida, enquanto ela ainda era uma coisinha engraçadinha. As pessoas se divertiam com a criança pequena como um animalzinho, um macaquinho impudico. Se ela morresse então, como muitas vezes acontecia, alguns podiam ficar desolados, mas a regra geral era não fazer muito caso, pois outra criança logo a substituiria. A criança não chegava a sair de uma espécie de anonimato (ARIÈS,1981, p.10).

Este estudioso francês foi um dos grandes ícones que colaboraram para compreendermos o que hoje conceituamos infância. Seus escritos sobre a infância nos fazem refletir acerca de uma categoria social que não está condicionada à vida adulta, e sim esta é que estar intrinsecamente dependente àquela. Pois só cuidando e preparando bem uma criança que teremos adultos sanos que não estarão revestidos de "hiatos" na sua psique. É através de uma puerícia saudável e tratada por profissionais que compreendam este estágio da vida humana que teremos adolescentes com menos problemas e adultos com poucas dificuldades para se relacionarem e conseguirem realizar seus projetos de vida. Silva (2007, p. 24), na sua tese de doutorado, analisa com sensibilidade e competência intelectual as contribuições de Philippe Ariès para o avanço que o conceito de infância conseguiu impetrar ao longo da história. Ela sintetiza dizendo que os relatos de Ariès

[...] sobre a história da infância é um marco para estudos e pesquisas sobre o sentimento moderno de infância. Ele nos mostra que a percepção da condição da infância enquanto idade específica, de um período da vida do homem, este olhar para a infância pela diferenciação entre criança e adulto é algo novo na nossa história e só aparece no século XVI e XVII, não que antes disto a história houvesse negligenciado, abandonado ou desprezado a infância, mas só a partir desse período começa a se desenvolver um sentimento novo em relação à infância e começa a se destacar a idéia de que a percepção, a periodização e a organização das etapas da vida se dão em função do próprio desenvolvimento da sociedade. 

  Próxima
Como referenciar: "A Infância como Categoria Histórico-Social" em Só Pedagogia. Virtuous Tecnologia da Informação, 2008-2024. Consultado em 16/04/2024 às 13:22. Disponível na Internet em http://www.pedagogia.com.br/artigos/infancia/