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Reflexões Sobre as Possíveis Causas do Fracasso Escolar em Matemática (página 5)


Além do problema estrutural apontado, vejo também o grave problema do ensino de matemática que decorre da ausência de quaisquer relações da matemática com o cotidiano, deixando de esta ciência ser tratada como linguagem, ou mesmo como instrumento de compreensão do mundo, nos termos de Freire (1998:26) quando diz: Não temo dizer que inexiste validade no ensino de que não resulta um aprendizado em que o aprendiz não se tornou capaz de recriar ou refazer o ensinado.

O currículo de matemática encontra-se repleto de conteúdos sem significados tanto para o aluno como para o professor, conteúdos esses que exigem altos níveis de abstração e que não fazem a menor ligação ou sentido com a realidade dos alunos.

 Muito embora não acredite que devam ser ensinados apenas conteúdos que serão "utilizados no supermercado", expressando uma visão pragmática de ensino, assumo que o aluno deve ter consciência ou entendimento do conhecimento acumulado pela humanidade. Contudo, esses conhecimentos devem estar contextualizados, de forma tal que o aluno possa saber de onde veio e qual sua importância histórica. Penso ser importante - e talvez imprescindível - trazer para as aulas de matemática as suposições, as argumentações, os sentidos e os significados efetivos dos raciocínios lógico-matemáticos.

De outra forma, ao meu ver, os documentos oficiais - desde a LDB 9394/96 - colocam como objetivo principal a formação do cidadão, embora precisemos entender que cidadania é essa. A orientação expressa nos Parâmetros Curriculares Nacionais diz ser preciso compreender a cidadania como participação social e política, assim como exercício de direitos e deveres políticos, civis e sociais, adotando, para tanto, no dia a dia, atitudes de solidariedade, cooperação e repúdio às injustiças, respeitando o outro e exigindo para si o mesmo respeito.

Observando um pouco mais atentamente essa orientação, vale pôr em questão que direitos e deveres são esses numa sociedade tão desigual, em que os dominantes têm o poder sobre os meios de produção, onde há controle da informação e das decisões políticas que estão sempre nas "mãos deles".

Então, se faz necessário refletir sobre a cidadania que estamos produzindo e que cidadania precisamos construir na escola, uma vez que a educação não é neutra e toda ação que desenvolvermos na escola tem implicação política.

Desta maneira, acredito que o ensino de matemática deve favorecer a percepção da realidade pelos alunos na busca da construção de seres humanos mais críticos. Por meio da matemática podemos discutir e entender de política e economia, desde que se venha a ensinar formas de leitura compreensiva de jornais e revistas ou a oferecer uma leitura mais crítica da televisão, utilizando-se  gráficos, índices, além de proporcionar aos alunos oportunidades de entender certos aspectos das relações com a tecnologia.

Venho enfocando o âmbito geral da matemática, mas considerando sob enfoque, mais atentamente, as séries iniciais da escolaridade, nas quais se evidencia claramente o fracasso, apontado em vários momentos. Isto passa a ser compreensível quando vemos que muitos professores trabalham na linha "arme e efetue", deixando de desenvolver nos alunos sua capacidade de raciocínio, sua criatividade, tornando-os meros reprodutores de um conhecimento descontextualizado e sem sentido.

Esse fracasso é apontado nos resultados do SAEB - Sistema de Avaliação da Educação Básica. Nesse processo avaliatório definiram-se os seguintes critérios, conforme podemos observar no quadro abaixo:

Quadro 1. Construção de competências e desenvolvimento de habilidades na resolução de problemas em cada um dos estágios para a 4ª série do ensino fundamental.

 

 

Muito Crítico

Não conseguem transpor para uma linguagem matemática específica, comandos operacionais elementares compatíveis com a 4ª série  (não identificam uma operação de soma ou subtração envolvida no problema). Os alunos nesse estágio não alcançaram o nível da escala do SAEB.

 

 

Crítico

Desenvolvem algumas habilidades elementares de interpretação de problemas aquém das exigidas para a 4ª série (identificam uma operação envolvida no problema). Os alunos neste estágio alcançaram os níveis 1 e 2 da escala do SAEB.

 

 

Intermediário

Desenvolvem algumas habilidades de interpretação de problemas porém insuficientes ao esperado para os alunos da 4ª série (identificam, sem grande precisão, até duas operações). Os alunos nesse estágio alcançaram os níveis 3 ou 4 da escala do SAEB.

 

 

Adequado

Interpretam e sabem resolver problemas de forma competente. Apresentam as habilidades compatíveis com a 4ª série (reconhecem e resolvem operações com números racionais, de soma, subtração, multiplicação e divisão). Os alunos nesse estágio alcançaram níveis 5 ou 6 da escala do SAEB.



 

Avançado

São alunos maduros. Apresentam habilidades de interpretação de problemas num nível superior ao exigido para a 4ª série (reconhecem, resolvem e sabem transpor para situações novas, todas as operações com números racionais envolvidas num problema). Os alunos neste estágio alcançaram o Nível 7 da escala do SAEB.

Pelos dados obtidos observamos que 12,5% dos alunos estavam no estágio "muito crítico", 39,8% estavam no estágio "crítico", 40,9% estavam no estágio "intermediário", 6,8% dos alunos estavam no estágio "adequado". Contudo, não se encontrou ninguém (0,0%) no estágio "avançado".

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Como referenciar: "Reflexões Sobre as Possíveis Causas do Fracasso Escolar em Matemática" em Só Pedagogia. Virtuous Tecnologia da Informação, 2008-2024. Consultado em 18/05/2024 às 10:57. Disponível na Internet em http://www.pedagogia.com.br/artigos/fracassoescolar/index.php?pagina=4