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Agricultura e Ensino na Amazônia do Século XIX: A Escola de Primeiras Letras na Colônia Benevides (página 3)

A primeira escola achava-se, sob a direção da professora Filomena Rodrigues da Silva que cuidava da educação das meninas; as duas do sexo masculino sob os cuidados do padre Lyra e do professor José Valhão de Vasconcelos. A escola que funcionava a noite estava sob a guarda do professor Antonio Duarte Balby. O ensino da leitura e escrita, associado aos valores religiosos constituía a base de ensinamento nessas escolas; situação que pode ser evidenciada pela apresentação do nível de conhecimento dos alunos feita pelo padre Lyra e da própria presença do pároco com um dos professores. De acordo com os dados da administração da colônia, dos 161 alunos matriculados de 1º de agosto a 06 de setembro de 1878, e que estavam sob os cuidados do padre Lyra, este fazia questão de destacar que: "143 começavam a ler o a-b-c, 13 balbuciavam as primeiras silabas, 03 já soletravam nomes, e outros 03 possuíam princípios de leitura".

Nas escolas dos núcleos coloniais do Pará, predominavam o que se poderia chamar de escolas primárias, ou seja, eram instituições de ensino dedicadas ao ensinamento elementar que consistia na leitura, escrita, quatro operações aritméticas, noções práticas do sistema métrico, doutrina cristã e da religião do Estado, e costura para as meninas. No caso de ensinamentos mais adiantados como a gramática portuguesa, caligrafia, desenho linear, aritmética avançada, elementos de geometria, de geografia e de história estes eram ministrados somente nas escolas públicas da capital ou nas sedes dos municípios mais populosos. Caso houvesse interesse de continuar os estudos era necessário que os filhos dos colonos se deslocassem para essas localidades; o que quase sempre não acontecia.

A criação de escolas na Colônia Benevides estava circunscrita a um contexto marcado por discursos que tem como propostas principais a disseminação da instrução pública a todos os habitantes do país. De acordo com as autoridades provinciais o desafio era a expansão das escolas aos lugares distantes e pouco povoado.  Nesse aspecto, diríamos que o conceito de ensino pensado pelas autoridades locais, se remete ao surgimento de um espaço educacional articulado aos interesses do Estado. No entanto, há de se considerar as resistências, conflitos e diversidades das práticas pedagógicas que caracterizaram a implantação e implementação da forma moderna de educação pensada para o país. De acordo com Irmã Rizzini, as práticas tradicionais de socialização talvez tenham sido as mais resistentes ao modelo escolar oficial, por este "competir" com as famílias, tutores e protetores, uma vez que acabava usurpando as crianças na ocupação do tempo e do espaço, além do que tentava impor um aprendizado que nem sempre era o mais valorizado em seu meio, ou que garantisse a reprodução dos valores familiares (RIZZINI, 2004, p. 78).

Na Amazônia, como em outras regiões brasileiras, o processo de afirmação e expansão da forma escolar sofreu reveses vindos de todas as partes e pela própria diversidade da constituição étnica e cultural da população. Esta questão se refletia no número de crianças freqüentando a escola e nos índices de participação nas aulas. Nos dados contendo a freqüência nas escolas da Colônia Benevides, o que se observava era que muitos alunos deixavam de ir à escola; o que quase sempre era atribuído pelas autoridades à falta de interesses dos pais "que deixavam de enviar seus filhos, preferindo levá-los para o trabalho na lavoura"; afirmava o diretor da colônia na época, Henrique Costard.

A acusação de que as famílias se mostravam indiferentes à instrução de seus filhos omitia, em grande parte, a incapacidade do governo em garantir o ensino público às populações desprovidas de recursos. As escolas públicas primárias, responsáveis pelo ensino das primeiras letras, eram quase sempre isoladas; ou seja, cada escola tinha um professor que regia uma aula, atendendo a alunos de várias idades, na faixa etária que podia ir dos 6 aos 15 anos. No caso de escolas com grande número de crianças, estas podiam ter o auxilio de um professor adjunto, o que não resolvia o problema de manter crianças de diferenciadas idades frequentando o mesmo espaço e obtendo o mesmo tipo de ensinamento. A casa utilizada como escola era alugada pelo professor ou professora, que neste mesmo espaço morava com a família, reservando um dos cômodos para a função pública; o que não deixava de se constituir enquanto locais improvisados. A escolha da casa cabia ao mestre; o que levava os visitadores das escolas, responsáveis pela fiscalização destes estabelecimentos, à denúncia de que, em geral, as residências eram acanhadas, anti-higiênicas e sem ventilação. No interior, faltavam habitações apropriadas, levando, em alguns casos, à instalação de escolas em verdadeiras palhoças. A falta de utensílios, mobílias e livros levavam os professores a utilizarem o que tinham à mão e ao que estavam habituados. Os meios disciplinares, quase sempre, extrapolavam o permitido por lei, fazendo com que as crianças aprendessem sob o jugo do "terror do mestre", como diziam alguns visitadores. No caso específico da Colônia Benevides as escolas funcionavam em prédios improvisados, uma a proximidade da Igreja de Nossa Senhora do Carmo e o outro nos fundos da diretoria do núcleo. Estas duas salas de aulas atendiam até 50 crianças cada uma.

Embora ficassem evidentes os problemas enfrentados pelo ensino público no Pará, o governo reduzia esses problemas aos obstáculos impostos à sua difusão pelos hábitos, costumes e modos de viver da população. Era comum ouvir das autoridades que a educação na província mantinha-se acanhada devido a imensa região e o isolamento de sua população. No entanto, acreditamos que as dificuldades de se implantar um ensino regular na província do Pará e que garantisse a permanência dos educados nas escolas públicas era resultado das duas situações; se por um lado não havia ações do poder público em criar espaços de ensino que melhor atendessem aos educandos, por outro há uma resistência dos colonos em encaminhar os filhos para freqüentar os improvisados estabelecimentos de ensino. Essa resistência dos colonos quanto a encaminhar os filhos para as escolas públicas é registrada na fala dos administradores. Para as autoridades provinciais as tentativas de reforma da instrução pública esbarravam na necessidade da reforma daquilo que chamavam de "reforma indiana" numa alusão ao modo de vida das comunidades indígenas e que em parte havia sido adotado pelos colonos.

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Como referenciar: "Agricultura e Ensino na Amazônia do Século XIX: A Escola de Primeiras Letras na Colônia Benevides" em Só Pedagogia. Virtuous Tecnologia da Informação, 2008-2025. Consultado em 25/10/2025 às 21:50. Disponível na Internet em http://www.pedagogia.com.br/artigos/benevides/index.php?pagina=2