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A Inclusão Social do Portador de Epilepsia na Educação Infantil (página 2)


    
2.1. A INCLUSÃO SOCIAL DO PORTADOR DE EPILEPSIA NA EDUCAÇÃO INFANTIL NA REALIDADE BRASILEIRA

Não é incomum, na sociedade brasileira e até mesmo mundial, notar-se a presença constante de atos e posturas de preconceito em seus mais diversos aspectos. O preconceito é fruto, basicamente, de um processo educativo paternalista que dominou o mundo durante muito tempo, tendo as instituições- seja o Estado ou outras organizações politicamente fortes - forças suficientes para manipular a mentalidade da população no sentido de desenhar um padrão do que é certo, bonito e aceitável. Tendo em vista este histórico de padronização de aparência, convivência, cor, sexualidade, entre outros, a educação veio, ao longo dos anos, se desenvolvendo sob a batuta dessas ideias, gerando, assim, uma sociedade implícita ou explicitamente preconceituosa.

No caso dos portadores da Epilepsia, não é diferente. Há reconhecidos mitos sociais que descrevem os portadores da doença como "possuídos por forças demoníacas", entre outros absurdos propagados por aqueles que desconhecem e ignoram a força e a realidade que é essa desordem cerebral. Já em 1898, Afrânio Peixoto, médico e membro da Academia Brasileira de Letras, em sua Tese de Doutoramento à Faculdade de Medicina da Bahia sob o título Epilepsia e Crime afirmava:

O preconceito, seja qual for a grandeza de sua envergadura e a natureza de sua constituição, em qualquer terreno em que por ventura tenha aparecido, foi sempre um custoso obstáculo a superar na marcha regular de uma verdade. No terreno científico ele tem sido, vezes continuadas, a trave pesada, diante da qual o entibiado tem cedido o esforço de que vinham animados, esmorecidos diante da dificuldade de transpô-lo ou receosos da tentativa de desatravancar o caminho de sua importuna presença. "Resta-me, porém, uma convicção, assentado pelo que tem de justeza e verdade e que aqui deixo: a criminalidade do epilético é bem uma revelação sintomática da epilepsia.
Para Peixoto, portanto, não é crime ser epilético e o preconceito neste sentido é um verdadeiro equívoco. Além disso, muitas vezes, segundo o autor, o crime é um dos sintomas da Epilepsia. Desta forma, fica evidente que o portador da Epilepsia não é um criminoso, mas o crime, muitas vezes, pode ser fator sintomático da crise epilética.

Na esfera infantil, o problema se torna ainda mais latente. A infância, todos sabem, é uma época em que a afetividade e a atenção se tornam aspectos fundamentais para o desenvolvimento do indivíduo. Ao ter que conviver com uma doença que causa diversos danos à autoestima e constrangimento, a criança já passa por dificuldades psicossociais que podem ser irreversíveis. Quando, além de tanto, essas precisam encarar o preconceito, as dificuldades de superação se tornam ainda maiores, sendo, muitas vezes, impossível reverter o quadro e reinserir a criança no meio social. Sabe-se que grande parte das síndromes epilépticas tem início na infância e cerca de 50% dos casos de epilepsia ocorrem em crianças menores de 5 anos de idade.

Segundo Guerreiro (2000), é alta a frequência da Epilepsia na idade escolar. Assim, além das dificuldades enfrentadas devido á própria doença, há ainda que se considerar a inabilidade de grande parte dos gestores e educadores quanto à necessidade de lidar com tal problema e a rejeição por parte dos demais colegas de turma, o que invariavelmente prejudica o rendimento escolar da criança portadora de Epilepsia. Desta forma, é necessária uma adequação da linguagem e do próprio processo de ensino/aprendizagem, preparação para lidar com as crises e amenizar a forma da comunidade escolar enxergar o problema, a fim de oportunizar a criança a mesma qualidade de aprendizado oferecida aos não-portadores, de maneira inclusiva e revertendo possíveis danos intelectuais causados por esta realidade.

No Brasil, a ideia de inclusão se deu de forma mais objetiva a partir da década de 40, com a Declaração Universal dos Direitos Humanos e a edição de diversos documentos tratando do tema, como a Declaração Mundial Sobre Educação para Todos e "Plano de Ação para Satisfazer as Necessidades Básicas de Aprendizagem"; Declaração de Salamanca; Convenção da Guatemala e a Declaração de Montreal.

Segundo o Ministério da Educação do Brasil e suas atuais políticas de inclusão, aluno portador de necessidades especiais é aquele que apresenta necessidades específicas de aprendizagens curriculares, diferenciadas dos demais alunos e que requeiram recursos pedagógicos e metodologias específicas, sendo assim classificados: alunos com deficiência; alunos com condutas típicas e alunos com superdotação/altas habilidades.
Com a Resolução n.2/2001 que instituiu as Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica, houve um avanço na perspectiva da universalização e atenção à diversidade, na educação brasileira, com a seguinte recomendação, em seu Art. 2º,
Os sistemas de ensino devem matricular todos os alunos, cabendo às escolas organizar-se para o atendimento aos educandos com necessidades educacionais especiais, assegurando as condições necessárias para a educação de qualidade para todos.

Apesar das determinações do Estado no sentido de incluir e da responsabilidade da escola em buscar técnicas pedagógicas que possam propiciar aos portadores de necessidades especiais - entre eles os epiléticos - a realidade que se mostra é bastante diferente. É latente a ineficácia da escola, especialmente as públicas, na tarefa de lidar com as crianças que necessitam de um maior apoio por parte dos educadores. A educação que deve ser inclusiva, é muitas vezes, excludente, tendo em vista que, por ser especial, muitas vezes o infante não consegue se enquadrar às atividades propostas, estando assim, retraído e, portanto, excluído.

Assim, fica comprovado que o processo de inclusão não depende apenas de uma legislação que o garanta, mas de uma estrutura que possa, de fato, efetivá-lo. Para Saviani (2001), o papel do professor nesse processo de inclusão é fundamental, uma vez que, ele é o mediador do processo ensino/aprendizagem. Na verdade, cabe-nos até, alguns questionamentos: a oferta de ensino aos alunos com necessidades especiais na rede regular deve acontecer porque está na Lei, ou porque acreditamos em suas condições de aprendizagem real? Devemos incluí-los porque nos causam pena ou porque vemos neles a possibilidade real de participação e contribuição na sociedade?
A estruturação necessária se dá porque, na prática, a inclusão de portadores de necessidades especiais no Brasil ainda engatinha nos cernes burocráticos e de falta de vontade política. Se a lei garante, é necessário ao Estado, também, criar mecanismos para que a lei possa ser cumprida. A realidade é que, na grande maioria das escolas, não há capacitação para lidar com problemas e necessidades específicas das crianças especiais.

No caso dos portadores de Epilepsia, a situação se torna ainda mais complexa. Isto porque não se trata apenas de proporcionar práticas pedagógicas que garantam o aprendizado do aluno, mas também de lidar com questões relacionadas à saúde deste, tendo em vista que a Epilepsia é uma doença que proporciona crises, muitas vezes constantes e que, é necessário um atendimento básico no momento em que essas crises ocorrem. Neste ínterim, é necessário, antes de tudo, levar informação à comunidade escolar, pois é exatamente a falta de informação que leva ao preconceito. Muitos acham, por exemplo, que a Epilepsia é uma doença contagiosa e que a saliva, no momento da crise, transmite a doença. Realidades como essas precisam ser mudadas dentro da própria escola através de palestras e campanhas informativas, desfazendo o estigma que acompanha a doença e prejudica os seus portadores.

É preciso, portanto, que a comunidade escolar - gestores, professores, funcionários e alunos - pesquise, estude, compreenda, informe e desfaça o estigma negativo que carrega o portador de Epilepsia. Sabe-se que a Epilepsia é composta de vários tipos diferentes de crises, que vão de simples alterações comportamentais até o mais perigoso tipo, composto por convulsões e movimentos corporais descompassados, na qual o portador pode, inclusive se ferir.

Portanto, além de elaborar técnicas pedagógicas capazes de incluir efetivamente, não apenas no que concerne ao aprendizado, mas às relações sociais, é preciso à escola e aos seus membros preparar o ambiente escolar para lidar com a criança epilética, sua doença, suas crises, como agir nos momentos difíceis e como não tornar o problema ainda maior, tirando do portador a chance de crescer como pessoa e ser social.
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Como referenciar: "A Inclusão Social do Portador de Epilepsia na Educação Infantil" em Só Pedagogia. Virtuous Tecnologia da Informação, 2008-2024. Consultado em 13/12/2024 às 08:33. Disponível na Internet em http://www.pedagogia.com.br/artigos/inclusaoepilepsia/index.php?pagina=1