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Videoaulas e imposição social: como pode um educador ser criativo se o que lhe pedem ninguém o ensinou?

Autor: Camila Nagem Marques Vieira e Maria Vitória Campos Mamede Maia
Data: 08/07/2020

Nas últimas semanas, nossas escolas e universidades foram fechadas e subitamente as formas conhecidas de ensinar e aprender precisaram ser interrompidas, repensadas e ajustadas.

Fomos empurrados para um grande senão pedagógico. As realidades vividas e os regionalismos presentes em nosso país, além das ações específicas adotadas por Estados e Municípios frente à pandemia de COVID-19, tornaram as práticas pedagógicas durante a quarentena tão múltiplas que não é possível tratá-las como únicas.

Os planejamentos coletivos foram implodidos, os projetos escolares postos de lado, as rotinas suspensas e a necessidade de sobreviver para escolas e docentes tem sido maior do que a possibilidade de pensar e agir criativamente sobre o vivido. Ao analisar as estratégias adotadas, os relatos de famílias, alunos e professores durante o período observamos que muitas dessas foram impostas, pois, no primeiro momento não houve tempo para a discussão das ações adotadas. Entendidas como momentâneas (deveriam durar poucas semanas), os envios de tarefas e as videoaulas surgiram unilateralmente de forma nada democrática ou lúdica.

A questão que com a qual podemos colaborar é a reflexão sobre o uso de videoaulas para a Educação Básica e de que formas esta metodologia de ensino que, de um dia para o outro aportou em diversas casas e transformou o modo de ensinar, bem como o modo de nossos alunos se relacionarem com o conteúdo e com seus professores, pode ser ou não criativa.

Neste momento de pandemia, as instituições educacionais possuem papel importante na orientação das famílias e da sociedade como um todo, sendo necessária a continuidade e o investimento na relação escola-família. A questão é ofertar propostas coerentes com as realidades vividas. A comunicação, o envio de vídeos e atividades podem ser estratégias extremamente válidas para uns. Já, para outros, o contato excessivo ou a simples lembrança pode ser fonte de sofrimento e, portanto, nada criativo, pois lidar com a separação, com a falta de contato, com a saudade pode ser dolorido.

O conhecimento necessita ser mediado e o vínculo e a presença de um ensinante suficientemente bom são fundamentais para o sucesso da aprendizagem. Tudo isso porque o educar é muito mais que passar conhecimento ou assistir a um conteúdo. Neste sentido, as aulas online e as videoaulas precisam ser adequadas à faixa etária e à autonomia dos alunos frente aos recursos tecnológicos necessários ao sucesso desse formato. As tarefas precisam ser exequíveis e contextualizadas ao distanciamento social e ao momento vivido.

Porém, ao nosso ver, muitas das formas de ensinar não vem sendo criativas, pois, negligenciam as especificidades dos alunos, as diversas formas de aprendizagem e passam por cima das demandas familiares em tempos de distanciamento social.  A busca por conteúdo, o corte e cole de práticas, a reprodução de apostilas e atividades tal como seriam feitas em sala, afastam o interesse dos alunos e imputam aos pais, em geral, às mães e avós, demandas que tornam as tarefas escolares para muitos um pesadelo.  
Gerenciar todas essas demandas não tem sido tarefa fácil: os docentes foram jogados em um looping infinito de reuniões online, produção de material e filmagem de conteúdos. Houve a precarização do seu trabalho, pois precisou do dia para a noite ele ser: produtor de conteúdo, designer gráfico, videomaker, editor e especialista em mídias e sei lá mais quantas tarefas dadas pelas escolas, que no formato de EaD são exercidas por uma equipe multidisciplinar e preparada para tal.

Seria criativo, lúdico e saudável exigir de todos da maneira como se tem exigido? Acreditamos que não, pois entendemos que o formato de videoaulas ou aulas online, focado na continuidade de um currículo prescrito sem considerar o momento vivido, tem sido fonte de adoecimento psicológico de docentes, mas também de discentes e de seus cuidadores.
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Como referenciar: "Videoaulas e imposição social: como pode um educador ser criativo se o que lhe pedem ninguém o ensinou?" em Só Pedagogia. Virtuous Tecnologia da Informação, 2008-2024. Consultado em 19/04/2024 às 00:46. Disponível na Internet em http://www.pedagogia.com.br/artigos/videoaulas/?pagina=0