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Ensino Fundamental de Nove Anos Desafia a Gestão Escolar: da Sala de Aula e da Escola (página 8)

Consideramos também que está turma do primeiro ano amparada em lei não sofreu o corte etário que era de 30 de março, portanto tínhamos um primeiro ano sem as idades adaptadas. Ao final do ano não tínhamos uma proposta pronta para a turma do 1º ano, mas tínhamos encaminhamentos significativos e, principalmente, uma vivência que nos trouxe muitos aprendizados em relação a estas crianças de seis anos.

Em 2007, pensando no processo de continuidade, fui desafiada a assumir o 2º ano eu seria professora alfabetizadora. A responsabilidade era enorme principalmente, pelo fato das duas professoras que eram consideradas referência de 1ª série não estavam mais nesta série. Esta seria a minha primeira experiência com alfabetização, dentro de um currículo que estava em construção. No decorrer deste processo formal de aprendizagem da leitura/escrita pude perceber que alfabetizar crianças é muito mais amplo do que simplesmente fazer ler e escrever. Ferreiro (1992) coloca que a alfabetização é um longo processo, no qual o aprendiz observa, estabelece relações, organiza e interioriza conceitos, duvida destes e os re-elabora até chegar ao código alfabético usado pela sociedade letrada.

Sabemos que cabe à escola trabalhar a função social da escrita e da leitura, para isso no decorrer dos anos nos utilizamos de vários materiais como livros, revistas, jornais, histórias em quadrinhos, receitas, bilhetes... O maior desafio que precisa ser enfrentado pelas crianças como um conhecimento a ser descoberto é perceber que estes recursos são fundamentais em sua vida diária.

O envolvimento que tive com as crianças neste processo de alfabetização me impressionou, eu vivia as angústias delas, as alegrias pelas conquistas e pude assim perceber que a afetividade neste processo de ensino-aprendizagem é de suma importância. Este estabelecimento de um vínculo afetivo como constata Cunha (1995) entende como professor afetivo, aquele que consegue estabelecer uma relação pessoal com seus alunos considerando a história e a subjetividade dos mesmos assim como a própria. Ser afetivo não significa estar fora do papel de mediador do processo de ensino/aprendizagem, mas se colocar como protagonista deste processo, enquanto ser humano que participa afetivamente e efetivamente da construção de si e do outro.

Ao final do ano os resultados desta "transposição" do 1º para o 2º ano foram enriquecedoras para as nossas discussões e reorganizações curriculares, pois é na troca de saberes, de experiências enfim no planejamento coletivo que acontecem as mudanças na nossa ação educativa. Ao longo deste ano quando estávamos com duas turmas do Ensino de nove anos que foi possível realizar a reestruturação dos planos de curso das mesmas. Nesta troca de saberes onde uma professora havia permanecido no 1º ano e a outra(eu) tinha seguido para o 2º  ano, é que se pode fazer uma leitura mais ampla e clara do que realmente era esta Lei dos nove anos. Esta não veio a agregar mais um ano e, sim, veio propor a quebra de paradigmas. Implantar o Ensino de nove anos implica em mudar não só a escola, mas a sua organização em relação aos tempos escolares. Com o Ensino Fundamental de nove anos nós professores estamos vivendo a necessidade e a oportunidade de refletir e agir para conceber novas perspectivas para a realidade escolar.

5   ENSINO FUNDAMENTAL DE NOVE ANOS UMA POLÍTICA QUE NÃO SE FAZ SEM GESTÃO

O Educador ou coordenador de um grupo é como um maestro que rege uma orquestra. Da coordenação sintonizada com cada diferente instrumento, ele rege a música de todos. O maestro sabe e conhece o conteúdo das partituras de cada instrumento e o que cada um pode oferecer. A sintonia de cada um com o outro, a sintonia de cada um com o maestro, a sintonia do maestro com cada um e com todos é o que possibilita a execução da peça pedagógica. Essa é a arte de reger as diferenças, socializando os saberes individuais na construção do conhecimento generalizável e para a construção  de processo democrático (Freire, in: Aguiar, 1999, p.115).

O termo Gestão, assim como vem sendo compreendido, é relativamente recente, porém, de extrema importância, na medida em que desejamos uma escola que atenda às atuais exigências da vida social que é a de contribuir para a formação de cidadãos, oferecendo, ainda, a possibilidade de apreensão de competências e habilidades necessárias e facilitadoras da inserção social. Tanto a gestão administrativa - que compete à direção, quanto à pedagógica - que compete à coordenação quanto a de sala de aula que compete ao professor são de extrema importância para que se efetive a política pública do ensino fundamental de nove anos. Cada qual na sua função serão co-autores na construção de uma nova proposta pedagógica em suas escolas.

A LDB reconhece a escola como um importante espaço educativo e nos profissionais da educação competência para participar da elaboração do projeto pedagógico da escola. Nesta perspectiva democrática a lei amplia o papel da escola frente à sociedade, colocando-a como centro de atenção das políticas educacionais mais gerais e sugere o fortalecimento de sua autonomia. A LDB estabelece diretrizes que definem os princípios, as finalidades, as intenções e os objetivos da educação brasileira; as bases que se referem aos níveis e modalidades de ensino; aos processos de decisão; as formas de gestão e as competências e responsabilidades relativas à manutenção e ao desenvolvimento do ensino no país... Por outro lado, ela delega aos sujeitos da escola a tarefa da elaboração do projeto pedagógico.

As mudanças da Lei nº 11.274 desestabilizaram uma proposta que há muito necessitava de uma reestruturação, pois a implantação dessa política pública desestabilizou as estruturas políticas, administrativas e pedagógicas das escolas. Esta conduz a uma virada paradigmática onde existe a necessidade de garantir condições de acesso, permanência, conclusão e sucesso escolar e não apenas o acréscimo de um ano incluindo crianças de seis anos do ensino obrigatório.

"É preciso entender que as leis não mudam a realidade como um toque de mágica, devendo ser vistas mais como pontos de partida para os indivíduos pensarem suas próprias condições e transformá-las. Por isso, não basta a LDB (Lei nº. 9.394/96) atribuir aos estabelecimentos de ensino a tarefa de elaborar o projeto pedagógico; é preciso que a escola, não confunda autonomia com soberania, encontre as alternativas teóricas e praticas para mostrar aos seus segmentos a importância de outra autonomia: construída, solidária e dialogada." ( Progestão, módulo III, p22,  CONSED. 2008)

Neste momento existe a necessidade de construirmos uma nova escola, um novo currículo e um novo olhar para estes sujeitos, portanto:

"A matrícula aos seis anos no ensino fundamental deve constituir-se em momento de reconstrução da proposta pedagógica para os anos iniciais deste nível de ensino, de forma a assegurar o trabalho educativo adequado aos alunos de seis e sete anos no ensino fundamental, com atividades predominantemente lúdicas para o desenvolvimento da socialização, linguagem oral e escrita, outras linguagens: corporal, musical, visual, etc.- e pensamento lógico- matemático como integrantes de seu processo de alfabetização" (SEC/RS:2007).

A qualidade do ensino que tanto almejamos em nossas escolas somente irá se concretizar quando o eixo central das nossas discussões seja a organização curricular, pois é ela que vai assegurar uma aprendizagem voltada para as necessidades e o sucesso do aluno.

Segundo Sacristan (2.000, p.55), ao se pensar a construção de um currículo para educação básica, é necessário pensá-lo na sua totalidade, ou seja, ele deverá refletir um projeto de educação que "agrupe as diversas facetas da cultura, do desenvolvimento pessoal e social, das necessidades vitais dos indivíduos para seu desempenho em sociedade e as habilidades consideradas fundamentais".

Se o currículo for compreendido a partir desse entendimento, os conteúdos não podem se restringir aos clássicos componentes que derivam das disciplinas. O currículo, no início da escolarização, deve ser pensado de maneira totalizadora, pois se trata de um projeto educativo amplo, que refletirá todos os objetivos pretendidos na escolarização, em função das modificações que a escola, como instituição educativa, vem sofrendo nesse processo de reconstrução da própria sociedade.

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Como referenciar: "Ensino Fundamental de Nove Anos Desafia a Gestão Escolar: da Sala de Aula e da Escola" em Só Pedagogia. Virtuous Tecnologia da Informação, 2008-2024. Consultado em 18/05/2024 às 16:45. Disponível na Internet em http://www.pedagogia.com.br/artigos/ensinofundamentalnoveanos1/index.php?pagina=7