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Psicanálise Freudiana e Educação: os Professores enquanto Substitutos Paternos na Adolescência (página 3)

1.2 O primeiro amor, suas demarcações e implicações: introdução à linha de raciocínio

Segundo Freud (1907), o sujeito, já na sua mais tenra idade, é capaz de sentir as principais manifestações psíquicas referentes ao amor, ou seja, ternura, dedicação e ciúme. Ao falarmos de Complexo de Édipo, estamos falando justamente do período em que a criança, seja menino ou menina, demonstra seus primeiros traços de amor a seus pais, não necessariamente os biológicos, por receber deles afeto. Via de regra, o menino demonstra ter desejos intensos de amor por sua mãe, assim, concluindo por fim ser o pai seu rival; a menina, em primeira instância, também demonstra ter desejos intensos de amor por sua mãe, mas, enfim, realizando a troca de seu "objeto original", demonstra ter desejos intensos de amor por seu pai (Freud, 1996 [1931]).

É importante dizer que essa dinâmica se constitui por aquilo que, em psicanálise, foi intitulado "Ambivalência de Sentimentos", presente, em maior ou menor grau, na constituição de todo sujeito com quem menos se espera, isto é, pessoas amadas. Mas, temos de perguntar, ambivalência entre quais sentimentos? A resposta é entre os sentimentos predominantes de amor e ódio: amor ao objeto elegido, ódio ao terceiro, já que impõe à relação estabelecida demarcações. A experiência nos ensina que, onde houver uma forte demonstração de carinho, concomitantemente, haverá uma forte corrente de hostilidade inconsciente. Esse: "É o caso clássico, o paradigma da ambivalência dos afetos humanos." (FREUD, 2013 [1912-13], pp. 46-58). Em consequência, a criança é atormentada pela dúvida se é realmente amada ou não. Quanto a isso, a orientação de Freud (1996 [1907], p. 127) de que "Se as dúvidas que as crianças levam aos mais velhos não são satisfeitas, elas continuam a atormentá-las em segredo, levando-as a procurar soluções [...]." nos parece ser assaz preciosa, porque, se tais dúvidas não forem saciadas, serão recalcadas, isto é, estarão mais vivas do que nunca no inconsciente.
O embargo maior para a criança é o fato de ela não poder mais se enamorar de seus pais, devido à barreira do incesto, implicando a dissolução do Complexo de Édipo:

A menina gosta de considerar-se como aquilo que seu pai ama acima de tudo o mais, porém chega a ocasião em que tem de sofrer [por] parte dele uma dura punição e é atirada para fora de seu paraíso ingênuo. O menino encara a mãe como sua propriedade, mas um dia descobre que ela transferiu seu amor e sua solicitude para um recém-chegado (sic) (FREUD, 1996 [1924], p. 195).

Com efeito, é instaurada a "Castração", onde o menino, devido à sua supervalorização do pênis, é confrontado com a ameaça de perdê-lo, caso não dirija seus instintos sexuais a outro objeto que não seja sua mãe, o que lhe causa grande ressentimento e nostalgia. O menino chega a legitimar essa ameaça de castração em seu processo de socialização, ao perceber que a menina não tem o pênis. Esta, devido a não ter o pênis, julga-se inferior e objeto de injustiça, não lhe causando temor à ameaça de castração, mas inveja do menino por ter o pênis; seu ressentimento e sua nostalgia relacionam-se mais à perda do amor paterno (Freud, 1996 [1924], pp. 197-200).

No caso mais geral, isto é, na neurose³, e limitemo-nos somente a ele, a criança, menino ou menina, inscreve-se na "Lei da cultura" que refuta o incesto, sendo obrigada a eleger outro objeto de amor que não seja, em última instância, nem sua mãe nem seu pai. A solução é, portanto, buscar na cultura indivíduos que se assemelhem a seus pais, que sejam seus sub-rogados. De modo geral então, o menino vai à procura de alguém que seja substituto de sua mãe, enquanto a menina vai à procura de alguém substituto de seu pai. Todas suas relações posteriores, na fase adulta, terão como modelo as relações estabelecidas com seus primeiros objetos amorosos, os pais.  Por consequência:

Isso produz o que se poderia descrever como um clichê estereotípico (ou diversos deles), constantemente repetido - constantemente reimpresso - no decorrer da vida da pessoa, na medida em que as circunstâncias externas e a natureza dos objetos amorosos a ela acessíveis permitam, e que decerto não é inteiramente incapaz de mudar, frente a experiências recentes. [...]. Se a necessidade que alguém tem de amar não é inteiramente satisfeita pela realidade, ele está fadado a aproximar-se de cada nova pessoa que encontra ideias libidinais antecipadas; e é bastante provável que ambas as partes de sua libido, tanto a parte que é capaz de tornar-se consciente quanto a inconsciente, tenham sua cota na formação dessa atitude (sic) (FREUD, 1996 [1912], pp. 111-112).

Não podemos nos esquecer do conceito "Identificação", que está intimamente relacionado à conjuntura acima. A identificação é, sem dúvida, a mais "remota expressão de um laço emocional com outra pessoa. [...] na verdade, é ambivalente desde o início; pode tornar-se expressão de ternura com tanta facilidade quanto um desejo do afastamento de alguém." (FREUD, 1996 [1921], p. 109). A identificação com o objeto está relacionada mais ao fato de querer sê-lo, aliás, "a identificação esforça-se por moldar o próprio ego de uma pessoa segundo o aspecto daquele que foi tomado como modelo." (FREUD, 1996 [1921], p. 110). Na trama do complexo de Édipo, a saber, o menino identifica-se, paradoxalmente, com seu pai, mesmo que este seja seu rival, porque dominou seu primeiro objeto de amor; por não conseguir fazê-lo, identifica-se com aquele que o pode. Já a menina, um caso mais abstruso, identifica-se com a mãe, mas visando a substituí-la, a mostrar-lhe como é ser uma mulher e a ter uma conduta feminina perante o pai (Freud, 1996 [1924], pp. 197-200). É imprescindível expressar que tudo isso faz parte das fantasias da criança, mas que pode escoar para a vida real, caso não sejam empreendidos recursos adequados de desvios dessas fantasias tal qual prevê a ciência da psicanálise.

Nesta seção foi disponibilizada a introdução à linha de raciocínio da hipótese de o que os professores representam para adolescente em fase escolar, mostrando-se óbvio o fato de que sua raiz está nas relações edípicas. Com efeito, já é possível colocar de fato em execução a argumentação da hipótese do problema de pesquisa deste artigo. Para tanto, fica a serviço da seção seguinte.

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Como referenciar: "Psicanálise Freudiana e Educação: os Professores enquanto Substitutos Paternos na Adolescência" em Só Pedagogia. Virtuous Tecnologia da Informação, 2008-2024. Consultado em 03/05/2024 às 05:33. Disponível na Internet em http://www.pedagogia.com.br/artigos/psicanlise_freudiana/index.php?pagina=2