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Ensino Fundamental de Nove Anos Desafia a Gestão Escolar: da Sala de Aula e da Escola (página 3)

1.1 A Política Pública do Ensino Fundamental de Nove Anos. Ampliação de Direitos e Garantia dos Mesmos

O Ensino Fundamental de Nove Anos é uma política pública afirmativa de equidade social implementada pelo governo federal. Segundo o Plano Nacional da Educação (PNE), implantar progressivamente o mesmo, pela inclusão das crianças de seis anos de idade, tem duas intenções: "oferecer maiores oportunidades de aprendizagem no período da escolarização obrigatória e assegurar que, ingressando mais cedo no sistema de ensino, as crianças prossigam nos estudos, alcançando maior nível de escolaridade". Em outras palavras, o objetivo desta política pública afirmativa de equidade social é o de assegurar a toda criança um tempo mais longo de convívio escolar, maiores oportunidades de aprender e, com isso, uma aprendizagem mais ampla. No que se refere ao objetivo de equidade social, esta deve resultar na universalização do ensino fundamental, promovendo a inclusão de todas as crianças de seis anos, levando a uma menor vulnerabilidade a situações de risco e o aumento da escolaridade.

Além da questão posta, outros pontos importantes são destacados pelo MEC para justificar a implantação de uma nova política pública para o Ensino Fundamental. Dentre eles está o fato de que um número muito significativo - para não dizer maioria - de crianças brasileiras (principalmente crianças pobres financeiramente), até então, não ter atendimento escolar até os sete anos e apresentam índices altíssimos de repetência na primeira série. No cenário internacional o Brasil é um dos países que possui menor tempo de escolaridade obrigatória, perdendo para países da própria América Latina. De acordo com o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (SABE) há uma significativa diferença de desempenho entre estudantes da quarta série do ensino fundamental, quando a idade de ingresso na escola é tomada como parâmetro. 

Observando os indicadores nacionais estes apontam que, conforme pesquisas realizadas pelo Ministério da Educação, atualmente, das crianças em idade escolar, 3,6% ainda não estão matriculadas. Entre aquelas que estão na escola, 21,7% estão repetindo a mesma série e apenas 51% concluirão o Ensino Fundamental, fazendo-o, em média, em 10,2 anos. Acrescenta-se, ainda, que em torno de 2,8 milhões de crianças de sete a 14 anos estão trabalhando, cerca de 800 mil dessas crianças está envolvida em formas degradantes de trabalho, inclusive a prostituição infantil.

Esses dados reforçam o propósito de ampliação do Ensino Fundamental para nove anos, uma vez que permite aumentar o número de crianças incluídas no sistema educacional. Os setores populares deverão ser os mais beneficiados, visto que as crianças de seis anos das classes favorecidas já se encontram praticamente todas incorporadas ao sistema de ensino ? na pré-escola ou na primeira série do Ensino Fundamental.

Percebe-se, no entanto que não é simplesmente mudando legislações e ampliando um ensino que já vem a tempo precário que vamos garantir o Ensino Fundamental de melhor qualidade.  É preciso compreender que a implementação de mudanças educacionais não deve acontecer simplesmente pela aplicação de uma nova legislação, mas deve ser fruto de discussões e debates com quem está diretamente envolvido com a educação.

Devemos considerar também que o Brasil é um país de realidades econômicas, sociais e educacionais que diferem muito de estado para estado e que é preciso levar estas diferenças em consideração no momento de se implementar mudanças como essa.

Conforme Arroyo (1999) é ilusão acreditar "... que a inovação só pode vir do alto, de fora das instituições escolares, feita e pensada para elas e para seus profissionais, para que estes troquem por novos, como trocam de camisa ou blusa, velhas fórmulas, currículos, processos e práticas" (p. 134).

A ampliação de oito para nove anos exigirá mudanças na proposta pedagógica, no material didático, na formação de professor, bem como nas concepções de espaço-tempo escolar, currículo, avaliação, infância, aluno, professor, metodologias. É preciso clareza, no momento da estruturação destes nove anos, para assegurar o objetivo de que todas as crianças tenham um tempo mais longo de convívio escolar, maiores oportunidades de aprender, uma aprendizagem com qualidade e que não se antecipe o fracasso escolar em um ano, hoje fortemente evidenciado pela reprovação e evasão nas séries iniciais do ensino fundamental.

Fica cada vez mais evidenciada a necessidade de que as mudanças educacionais precisam vir acompanhadas por uma luta maior que ultrapassa a meras reformas e adequações. Antes, é preciso, se de fato o Brasil quiser ter uma melhoria na educação, pensar/conceber/construir uma política nacional a longo prazo, com prioridades claras e imune às mudanças e desequilíbrios políticos. Sem desconsiderar a importância/relevância e pertinência da universalização do acesso ao ensino fundamental, é preciso ter claro que esta conquista não é suficiente. É o primeiro passo de um projeto que deve vir acompanhado de investimentos voltados para melhoria das condições físicas e materiais da escola; qualificação da formação inicial e continuada dos profissionais da educação; efetivação de uma remuneração digna que evidencie uma nova postura de valorização para esses profissionais; adequação das atuais diretrizes curriculares do ensino fundamental; desenvolvimento da gestão democrática nas escolas e nos sistemas de ensino e; redimensionamento do sentido de qualidade na educação, dando-lhe a conotação de qualidade referenciada no social.

Somente pensando a educação como um projeto de sociedade, com a definição clara dos objetivos, a forma como eles devem se articular com as políticas públicas e a maneira como eles serão colocados em prática é que iremos conseguir visualizar um caminho para a construção de uma sociedade mais justa e igualitária que irá garantir a educação como um direito de todos os brasileiros. Quanto mais amadurecidas forem nossas propostas e seriamente discutidas, menores serão as nossas ilusões e maiores as perspectivas de podermos traçar um caminho promissor para uma educação básica de qualidade.

A ampliação do tempo de permanência da criança nessa etapa da Educação Básica implica em implementar reflexões sobre a infância, a criança, o papel do professor, procedimentos metodológicos, possibilitando o desenvolvimento de atividades de aprendizagem em sala de aula com jogos e brincadeiras, a implementação de um novo currículo. Um currículo inclusivo pautado na lógica dos sujeitos, na promoção e na inclusão. A criança vem para a escola para aprender, se isso não ocorre a escola fracassou em sua missão e a escola que fracassa leva toda uma classe social ao fracasso. Em razão disso, é importante que a implantação desta nova política tenha a criança e a infância como centralidade. Não qualquer criança, mas a criança situada numa cultura, num tempo e num espaço. Nessa direção, é possível constatar avanços significativos. As Diretrizes Nacionais para a Educação Infantil podem contribuir na construção das Diretrizes para o Ensino Fundamental de Nove Anos, principalmente para os anos iniciais, pois elas levam em consideração o sujeito infantil.

2   MINHA EXPERIÊNCIA ESTÁ ME CONSTITUINDO PROFESSORA


A minha atuação como professora de Educação Infantil e a minha atual atuação no Ensino Fundamental de Nove Anos me trouxeram inquietações e me fizeram constatar que o professor antes de mais nada deve ser:

Um profissional independente, com autonomia para decidir sobre seu trabalho e suas necessidades; alguém que está sempre em busca de novas respostas, novos encaminhamentos para o seu trabalho e não simplesmente um cumpridor de tarefas e executor mecânico de ordens superiores e, finalmente, alguém que tem seus olhos para o futuro e não para o passado. (Alonso, 1994, p.6)

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Como referenciar: "Ensino Fundamental de Nove Anos Desafia a Gestão Escolar: da Sala de Aula e da Escola" em Só Pedagogia. Virtuous Tecnologia da Informação, 2008-2024. Consultado em 28/04/2024 às 17:50. Disponível na Internet em http://www.pedagogia.com.br/artigos/ensinofundamentalnoveanos1/index.php?pagina=2