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A Construção de um Paradigma Pedagógico na Prevenção da Corrupção a partir da Análise Simbólica desse Fenômeno na Recente Produção Cultural para o Público Infantil (página 3)

4 - A busca de um herói anticorrupção

4.1 - A produção cultural recente

Analisando a produção cultural para o público infantil dos idos dos anos 70 do século passado até a atualidade, verificam-se as mutações na visão da ação estatal e da corrupção do agente público, nos elementos simbólicos descortinados em cada peça.

A produção na década de 70 se caracteriza pelo aspecto maniqueísta, pela necessidade de se combater um mal personalizado. A exceção da figura do policial, nota-se uma ausência do aparelho estatal nas histórias, na sua maioria de origem estadunidense,  e caso apareça algum agente público, ele se faz envolto em uma aura de perfeição, o "bom-mocismo". O grande crime é o crime contra a propriedade privada e contra a integridade do indivíduo. Os desenhos animados dessa época exaltam heróis, derivados dos clássicos heróis gregos e suas façanhas. Quando aparecem núcleos familiares, como os "Flinstones", a representação da ação estatal é diminuta, sendo na máxima vinculada a atividades laborais.

O desenho do "Scooby-Doo", até hoje de grande audiência, de forma inovadora mostra em suas tramas representativas órgãos que pelos seus interesses, burlam regras e buscam assustar aqueles que querem saber a verdade, revelando um tipo de vilão que faz uso da sua função em benefício próprio.

Esse período de grande polarização na geopolítica mundial reforçou esse maniqueísmo, mostrando a necessidade de nos posicionarmos no mundo, onde a propriedade privada é o valor máximo e absoluto, deixando ao Estado o papel policialesco de manter a Lei e a Ordem. Não existe espaço para se pensar um agente público se valendo de sua função em um Estado ausente, não-citado ou quando muito, deificado. Mostrar a corrupção seria subverter a ordem, o que era impensável para aqueles poderes vigentes.

A década de 80 gerou uma enxurrada de novos desenhos animados, além daqueles da década de 60 e 70 requentados, fruto da popularização da TV no Brasil. O ideal do combate ao mal personificado continua  e continuará em evidência, além da inserção de elementos mágicos e metafísicos, a presença de elementos monárquicos na forma perfeita e imaculada de se exercer o governo. Como exemplo, temos o famoso desenho "He-Man", e o reino de Etérnia.

No âmbito da corrupção, o "Inspetor bugiganga" e Robocop, similares em seus roteiros, começam a mostrar no aparelho policial elementos motivados por interesses diversos do interesse público. Apesar de ser um desenho pensado para adultos, "Os Simpsons" inauguram uma época de crítica aos costumes e a ação estatal, de forma concreta e cotidiana, trazendo questões inéditas nas produções infantis, que se limitavam à ecologia do "não pise na grama".

A década de 80 já demonstra a queda do paradigma maniqueísta, havendo espaço para a inclusão do aparelho estatal com maior frequência e em alguns casos com as usas falhas. Entretanto, não se registram exemplos da participação de grupos na condução da vida pública ou como instrumentos de pressão e de controle do Estado.

A década de 90 traz um novo enfoque do desenho animado, além do rompimento da hegemonia do mercado estadunidense. O "Politicamente correto" assume grande valor e a crítica social começa a ocupar o seu espaço. Exemplos de usurpação de poder por funcionários corruptos (Alladim-Disney), um novo "Simpsons" (Futurama) e um prefeito desidioso (Meninas super-poderosas), são muitas de  uma série de produções que têm o sarcasmo e a crítica como ingrediente principal, trazendo aquela geração o gosto antes proibido da contestação da realidade.

O sucesso infantil em livro e no cinema, "Harry Potter", caracteriza bem essas mudanças. Disputas de poder e o jogo de interesses da classe dominante da sociedade dos bruxos e seus reflexos na escola de Hogwarts levam ao público infantil as lutas intestinas de poder, apresentando vários funcionários da escola que deixam de cumprir seus deveres, traindo a instituição em nome de interesses pessoais ou de outros grupos. A série mostra um Ministro da magia politiqueiro, contrário muitas vezes ao interesse público e um ambiente de desconfiança pela ação desse Ministro e de seus prepostos.

A grande novidade é um desenho de sucesso chamado "Hey Arnold", que trata de um grupo de crianças (Como "Peanuts", "A turma da Mônica" e tantas outras) e suas questões cotidianas. Entretanto, o interesse pelas questões da vida pública é incentivada nos roteiros, tendo como ponto alto o longa metragem do desenho, em que Arnold precisa impedir que seu bairro seja demolido para a construção de um shopping center, mobilizando toda a cidade, demonstrando uma prática democrática em questões da vida cotidiana. Cabe registrar que, de alguma forma, a produção nacional "Turma da Mônica" apresenta temas similares em suas revistas, principalmente na década de 90 .

A década de 90 inaugura uma nova fase de desenhos animados, mais voltados a crítica social. Reflexo de um mundo que saia da polarização e que agora inicia os movimentos de convenções e tratados para o combate a corrupção. Era um período de mudança de paradigma, de explosão da comunicação, da consolidação da abertura, da queda do muro de Berlim, etc. Entretanto, como era típico dessa época também, os problemas eram trazidos a tona pelos desenhos, mas sem grandes movimentos de indicação das soluções. Inicia o denuncismo, a acusação das autoridades, a reclamação sistemática do governo, como se isso não envolvesse o povo.

Na produção para o público infantil, vilões se convertem em heróis e vice-versa, como reflexo dessa falta de confiança nos poderes estatuídos. As histórias se desenvolvem em uma constante instabilidade, em grandes sagas, gerando uma luta eterna que não se conclui em cada episódio, com grandes conflitos psicológicos, onde os heróis apresentam suas fraquezas humanas. Termina o super-homem que não se despenteia para combater os inimigos, dando força ao Peter Parker que enfrentava o aluguel.

A época atual já mostra um amadurecimento e predominância da temática crítica, ressaltando os sucessos "A turma do bairro", "Os padrinho mágicos", "Avatar" "Shrek", que trazem para o universo infantil (e adulto), agora difícil de se dissociarem, uma outra visão do aparelho estatal e do jogo democrático, com as suas lutas e nuanças. As crianças passam a se interessar cada vez mais e mais cedo pelas questões de adultos , fruto do liberalismo nas relações e no crescente acesso a informação pelas gerações mais novas. A questão da corrupção do "governo" torna-se assunto corriqueiro, moderno, ainda que a onda de individualismo e o enfraquecimento dos movimentos sociais tenha diluído as idéias de participação social como solução para esse problema tão vergonhoso.

Apesar de uma visão crítica da realidade ter se instalado na produção cultural, sem excluir , no entanto, a inserção de conteúdos em seus roteiros, a mostra de mazelas não apresenta grandes proposições de mudança, gerando o vácuo de um herói que combata também o mal que existe dentro dele.

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Como referenciar: "A Construção de um Paradigma Pedagógico na Prevenção da Corrupção a partir da Análise Simbólica desse Fenômeno na Recente Produção Cultural para o Público Infantil" em Só Pedagogia. Virtuous Tecnologia da Informação, 2008-2025. Consultado em 24/10/2025 às 23:54. Disponível na Internet em http://www.pedagogia.com.br/artigos/paradigmapedagogico/?pagina=2